SANGUE E SUOR NA CONSTRUÇÃO DE UM IMPÉRIO COLONIAL
Os
espanhóis iniciaram a ocupação da América desde a chegada de Cristóvão
Colombo às ilhas do mar do Caribe, em 1492. Foi ele quem fundou, numa
dessas ilhas, chamada de Santo Domingo, o primeiro
estabelecimento espanhol no Novo Mundo. Como era o dia 24 de dezembro,
Colombo deu ao forte ali construído o nome de Natividad (Natal, em
castelhano).
Além
de Santo Domingo, os espanhóis também ocuparam outras ilhas do Caribe,
entre elas as que hoje se chamam Cuba, Porto Rico e Jamaica. Os
espanhóis iniciaram a conquista da parte continental da América somente
depois que o metal precioso se esgotou nessas ilhas e sua população
nativa praticamente desapareceu. Foi então que teve início o
enfrentamento entre os espanhóis e os impérios asteca e inca.
A CONQUISTA DO CARIBE
“OS ESPANHÓIS COMEÇAM A PRATICAR CRUELDADES”
Que direito tinha a Coroa espanhola de apoderar-se de uma terra que já era habitada e que, portanto, tinha donos? Essa questão foi muito debatida na época por teólogos e juristas. A principal justificativa era que a ocupação tornaria possível ensinar a religião de Cristo aos habitantes da nova terra.
Porém,
para os conquistadores vindos da Espanha, esse objetivo estava longe
de ser o mais importante. Padres foram os primeiros a denunciar isso.
Um deles era Bartolomeu de Las Casas. Chocado com a violência dos
conquistadores nas ilhas do Caribe, ele escreveu o seguinte:
"Os
espanhóis, com seus cavalos, suas espadas e lanças começaram a
praticar crueldades estranhas; entravam nas vilas, burgos e aldeias,
não poupando nem as crianças e os homens velhos, nem as mulheres
grávidas ( ... ) e as faziam em pedaços como se estivessem golpeando
cordeiros fechados em seu redil."
LAS
CASAS, Bartolomeu de. O Paraíso destruído. A sangrenta história da
conquista da América Espanhola. Porto Alegre, L8cPM, 1984. p.32.
Na
ilha de Santo Domingo, os indígenas foram brutalmente explorados como
mão de obra para a agricultura e para a extração de ouro. Alguns padres
procuraram defendê-los. O espanhol Antônio de Montesinos foi um deles.
Dias antes do Natal de 1511, pronunciou um sermão, dizendo o seguinte
aos colonizadores:
"Eu sou a voz que clama no deserto!
Esta
voz afirma que estais em pecado mortal, por causa da crueldade e
tirania que usais com esta gente inocente; com que direito e com que
justiça conservais em tão cruel e horrível servidão a esses índios? Com
que autoridade fizestes guerras tão detestáveis a esta gente, que
estava em suas terras, mansa e pacífica, matando tão grande número
dela? Como é que vós os trazeis tão oprimidos e fatigados sem
alimentá-los ou curá-los quando adoecem com o excesso de trabalho, que
morrem assassinados para extrair o ouro de cada dia?
E
que cuidado tomastes para que sejam doutrinados e batizados, para que
conheçam a seu Deus e criador, ouçam missa e guardem as festas e
domingos?
Eles
não são homens? Não têm almas racionais? Não sois obrigados a amá-los
como a vós mesmos? Não compreendeis isso? Como estais tão adormecidos?
Ficai certos de que não podeis vos salvar assim."
LAS
CASAS, Bartolomeu de. História de Ias índias. In: Coletânea de
documentos históricos para o 1" Grau: 5" a e'séries. São Paulo, SE/Cenp,
1981. p. 83.
A ENCOMIENDA E A MITA
TRABALHANDO PARA O IMPÉRIO
À
medida que os nativos iam caindo sob o domínio dos espanhóis, passavam
a ser obrigados a lhes pagar tributos e trabalhar para eles. Desde o
início do século XVI, a maneira mais comum de um espanhol obter o
trabalho dos indígenas era conseguir uma Encomienda.
Era esse o nome de um privilégio que a Coroa concedia a alguns de seus
súditos. Quem recebia uma encomienda passava a ter autoridade sobre
uma comunidade indígena, com o direito de exigir trabalho de seus
habitantes. De acordo com as leis espanholas, a obrigação de quem
recebia uma encomienda era proteger os indígenas que ela abrangia e
ensinar-lhes a religião cristã.
Para
obrigar os indígenas a prestar serviço para os espanhóis, a Coroa
espanhola fez uso também da mita, o sistema inca de trabalho
obrigatório. O sistema foi adaptado e passou a funcionar do seguinte
modo: os chefes indígenas eram obrigados a enviar um certo número de
indígenas para trabalhar durante vários meses por ano para os espanhóis.
As leis espanholas mandavam que se pagasse um salário e que fossem
asseguradas boas condições de trabalho aos indígenas que estavam
obrigados à Mita. Mas
era raro que as leis fossem cumpridas. No Império Inca a mita não
colocava em risco a vida dos trabalhadores. Porém, sob o domínio
espanhol, muitos nativos morreram trabalhando nesse sistema.
Foi
por meio da mita que os espanhóis exploraram as ricas minas de prata
de Potosi (Bolívia) e Zacatecas (México). O trabalho em minas profundas
era extremamente árduo.
Poucos indígenas sobreviviam para voltar a suas casas, que podiam se localizar a centenas de quilômetros de distância.
A
escravidão dos indígenas era proibida pela Coroa, a não ser em certos
casos, como o de povos que não aceitavam tornar-se cristãos e combatiam
os espanhóis. Porém, na prática, os indígenas de uma encomienda ou os
que estavam sujeitos à mita eram tratados como escravos.
Na
América espanhola, milhares de indígenas morriam a cada ano, devido às
duras condições de trabalho, doenças trazidas pelos europeus, má
alimentação, maus-tratos e violências de todo tipo cometidas pelos
senhores. Nas Antilhas, toda a população indígena foi dizimada, e o trabalho passou a ser feito por escravos negros. Nem a Igreja nem a Coroa se opunham à escravidão dos negros.
CONSTRUIR UM IMPÉRIO, DIFUNDIR O CRISTIANISMO COM O MAIOR LUCRO POSSÍVEL
Durante muito tempo, a maior parte dos historiadores acreditava que o principal objetivo da colonização espanhola era explorar as riquezas da América. Na atualidade, porém, cada vez mais historiadores veem essa época de uma forma diferente, a qual vamos conhecer a seguir.
Os
reis espanhóis estavam muito interessados no ouro e na prata da
América e em qualquer oportunidade de lucro que ali pudesse existir.
Mas, além de obter riquezas, os reis espanhóis desejavam também
aumentar o número de súditos. Assim, precisavam impedir que os
indígenas fossem dizimados ou se tornassem simples escravos, pois
escravos não podiam ser súditos.
Além
disso, como você já sabe, propagar o cristianismo era a principal
justificativa para a ocupação das terras americanas. Mas esta não era
apenas uma justificativa, era realmente um dos principais objetivos do
governo espanhol. Os novos súditos teriam que ser cristãos, porque essa
era a religião do rei.
E
os particulares que vieram para a América? Assim como a Coroa, eles
também estavam interessados em riquezas. Porém, muitos dos que vieram
para as colônias espanholas formaram famílias, que ali se enraizaram e
permaneceram por muitas e muitas gerações.
Isso
indica que o objetivo dessas pessoas não era apenas enriquecer e
voltar para a Europa. Mesmo que quisessem, não seria nada fácil
retornar. Uma viagem pelo oceano, naquela época, significava meses de
viagem, tormentas, ataques de piratas ou corsários, possível falta de
alimentos, doenças e outras dificuldades.
As
cidades construídas na América também revelam as pretensões do domínio
espanhol. Eram sólidas e bem planejadas, com catedrais, mosteiros,
conventos. Por que os espanhóis construiriam tudo isto se considerassem
as colônias como simples fornecedoras de riquezas? Esta reflexão vale
também para a colonização portuguesa.
Em
resumo, com a colonização da América, a Coroa espanhola pretendia
expandir seu império, ampliar o espaço ocupado pela civilização
espanhola. Mas, por outro lado, a Espanha também organizou suas relações
comerciais com as colônias de um modo que lhe permitisse extrair o
máximo possível de lucros. Esta forma de relacionamento com as áreas
coloniais fazia parte do mercantilismo, como vimos em aula anterior. Os
historiadores a chamaram de Sistema Colonial.
O SISTEMA COLONIAL – Pacto Colonial
Para compreender as relações entre as colônias da América e os países colonizadores europeus, precisamos conhecer os seguintes conceitos:
·Metrópole: o país que tinha o domínio sobre a colônia. Na metrópole eram tomadas as decisões sobre o funcionamento da colônia.
·Colônia: a área dominada pela metrópole, à qual fornecia riquezas como metais preciosos e outros produtos.
·Monopólio
comercial: o direito que os comerciantes da metrópole tinham de, sem
concorrência, comprar os produtos coloniais e vender na colônia os
produtos trazidos da metrópole.
·Complementaridade:
o princípio pelo qual a colônia não deveria concorrer com a metrópole,
e sim complementar a economia metropolitana. Segundo esta ideia,
somente os comerciantes autorizados pela metrópole poderiam atuar nas
colônias. Assim, as autoridades metropolitanas poderiam ter controle
sobre o comércio, para que os lucros se concentrassem na metrópole. A
colônia deveria também fornecer os produtos que a metrópole não poderia
produzir, devido ao clima, por exemplo. É por esse motivo que as
colônias preferidas eram as localizadas em clima tropical.
Tabaco,
pérolas, peles, anil e cochonilha (corantes) eram alguns dos
principais produtos levados da América. Mas o mais importante, do ponto
de vista da Coroa espanhola, eram os metais preciosos. Até 1600, além
do ouro, os navios haviam levado para a Espanha cerca de 25 mil
toneladas de prata. Com essas riquezas, a Espanha tornou-se a mais
poderosa potência do século XVI. Por esta razão, esse período ficou
conhecido como o Século de Ouro da história espanhola.
O
Pacto Colonial pode ser definido como um conjunto de regras, leis e
normas que as metrópoles impunham às suas colônias durante o período
colonial. Estas leis tinham como objetivo principal fazer com que as
colônias só comprassem e vendessem produtos de sua metrópole. Através
deste exclusivismo econômico, as metrópoles européias garantiam seus
lucros no comércio bilateral, pois compravam matérias-primas baratas e
vendiam produtos manufaturados a preços elevados.
PARA ONDE FOI O OURO AMERICANO?
"A ESPANHA TINHA A VACA, MAS OUTROS TOMAVAM O LEITE"
O
governo espanhol procurou manter o máximo do ouro e da prata dentro de
suas fronteiras. Mas todas as medidas adotadas com esse objetivo foram
inúteis, e a maior parte do metal precioso acabou deixando a Espanha.
Os espanhóis tiveram de amargar a decadência econômica de seu país já a
partir de 1600, aproximadamente.
Para
onde foi essa riqueza? Uma grande quantidade foi usada para pagar as
despesas com as guerras. Uma parte foi usada para fazer joias ou para a
decoração de igrejas e palácios. Outra parte, talvez a maior de todas,
foi entregue como pagamento das compras efetuadas em outros países. O
escritor uruguaio Eduardo Galeano descreveu essa situação com a seguinte
frase: "A Espanha tinha a vaca, mas outros tomavam o leite".
O
princípio mercantilista segundo o qual possuir metais preciosos era o
mesmo que possuir riqueza levou outras nações (Holanda, Inglaterra,
França, entre outras) a aumentar as vendas para a Espanha, pois, quanto
mais vendiam, mais ouro e prata recebiam como pagamento. Daí surgiu
outro princípio importante para a economia da época: o de que o comércio
também produz riqueza.
De
fato, os países que vendiam mais do que compravam tinham um saldo
positivo na balança comercial. Deste modo, acumulavam ouro e prata, pois
os pagamentos eram feitos com esses metais. Graças ao comércio, esses
países conseguiram não só acumular metais preciosos como se tornaram
mais ricos do que a própria Espanha. Isso foi possível porque, para
vender aos espanhóis, os países fornecedores passaram a produzir mais.
Com
isto, muitos dos que tinham dinheiro sentiram-se estimulados a
utilizá-lo para abrir ou ampliar manufaturas. Assim, mais trabalhadores
puderam encontrar serviço, o governo pôde arrecadar mais impostos, e a
riqueza ia se acumulando nesses países.
VICE-REINOS E CAPITANIAS GERAIS
A ESPANHA DIVIDE SEUS DOMÍNIOS NA AMÉRICA
À
medida que se expandia o território sob domínio hispânico na América, a
Coroa espanhola pouco a pouco o dividiu em partes menores. Cada uma
dessas partes, chamadas vice-reinos e capitanias-gerais, ficava a cargo
de um governante diferente.
Um
dos objetivos dessa divisão era facilitar o controle sobre o
território e dar mais eficiência à administração: as dificuldades que
um governante encontrava para controlar e administrar uma parte do
território eram menores do que se fosse responsável por toda a colônia.
Pretendia-se também evitar que o poder na colônia ficasse concentrado
nas mãos de um único governante. Isso poderia representar perigo para a
Coroa, que poderia ter sua autoridade desafiada por um governante com
tanto poder.
Em
cada vice-reino, a mais alta autoridade era o vice-rei, nomeado
diretamente pelo monarca espanhol. O primeiro vice-reino surgiu no
México, em 1535. Chamava-se Vice-Reino de Nova Espanha e, além do
México, incluía quase toda a América Central.
Logo
depois, foi fundado o Vice-Reino do Peru (1543), abrangendo
praticamente toda a América do Sul atual (com exceção da parte
portuguesa, que daria origem ao Brasil).
Mais tarde, no século XVIII, o Vice-Reino do Peru foi desmembrado para formar mais dois vice-rei nos:
·Em
1717, foi formado o Vice-Reino de Nova Granada, abrangendo o
território que deu origem a quatro países atuais: Colômbia, Panamá,
Equador e Venezuela.
·Em
1771, a Espanha criou o último dos vice-reinos da América colonial: o
Vice-Reino do Prata. Seu território correspondia ao que hoje é a
Argentina, o Paraguai, o Uruguai e grande parte da Bolívia.
As capitanias-gerais - Flórida, GuatemaIa, Cuba, Venezuela e Chile - eram territórios menores, subordinados aos vice-reis.
Fonte: FIGUEIRA, Divalte Garcia (Para entender a HISTÓRIA). Ed. Saraiva
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